Cada vez que ouço esta canção lembro-me do 'noivo'...
O 'noivo' foi dos mais conhecidos loucos de Lisboa. Sempre apressado como quem tinha muito que fazer, reunião marcada, consulta a que ir, ele percorria a Baixa de ponta a ponta, sempre falando, falando muito e alto, gesticulando, procurando, bramando contra tudo e contra todos.
Fato preto, camisa branca e flor branca na botoeira, gentilmente cedida pelas vendedeiras do Rossio que se apiedavam dele, sapatos cambados de tanto calcorrear, o 'noivo' despertava as mais díspares reacções de quem passava.
Havia quem se assustasse com os gritos repentinos, quem metesse conversa a ver o que é que dava, o encolher de ombros de o que é que se há-de fazer ? Olhares de dúvida, de enjoados e de comiseração quando se conhecia a história.
Rezava a lenda ( ao fim de tantos anos foi promovido a lenda, se fosse hoje seria atracção turística muito melhor que os homens estátua) que, apaixonado loucamente por uma mulher lindíssima esta o teria deixado, literalmente a falar sozinho, no dia do casamento, e que ao dar-se conta disso teria caído, vítima de síncope, em pleno altar, como se um raio o tivesse atingido ao meio.
Quando voltou a si não dizia coisa com coisa e pôs-se a procurar a noiva pelas ruas de Lisboa, até morrer.
Quando ouço a canção lembro-me dele, completamente louco, a falar sozinho, a gesticular, bramando alucinado para o vazio...
Nos dias de hoje teria passado despercebido. A figura seria a mesma mas toda a gente pensaria que tinha um auricular..