Foram
estas batatas que despertaram os sabores da minha memória.
A Costa fez parte da minha vida nos anos 50 e 60, o que abarca a minha meninice, infância e adolescência.
Primeiro, por via de madrinha abastada e porreira, usufruíamos de 1 mês de férias na vivenda dela - Vivenda Lídia Maria, bem a meio da rua dos Pescadores.
Mais tarde, a minha mãe não foi de modas, e tivemos casa ao ano.
Ao princípio, e as imagens chegam-me por flashes, ir de férias era uma grande aventura.
Para mim, a Costa era muito loooonge !
Não havia carro, nem ponte. Malas e sacos e saquetas e nós - tudo de barco até Cacilhas e, depois, camioneta pelo caminho velho. Parecia eu que ia para Trás-os-Montes.
Só quando chegava lá acima, à curva dos Capuchos e via o mar lá muito ao fundo, é que eu sentia - férias !!!
Ia para o Paraíso. Literalmente.
As passadeiras de madeira tinham logo à entrada um aro encabeçado pelos letreiros com o nome dos 'banheiros' - lembra-me bem do Dragão Vermelho, do Tarquínio e do meu Paraíso!
E o que se caminhava para chegar às barracas ou aos toldos...vegetação, dunas, muitas topadas naqueles estrados...( se a gente já a conhecesse até podia cantar - Eu vim de longe, de muito longe, o que eu andei p'ráqui chegar !)
Pé na água, pé na areia, pé na barraca, enche balde, entorna balde e mais o jogo do prego e o das 5 pedrinhas e a minha mãe - está um bocadinho quieta que me enches de areia !
Nem pensar em atirar-lhe areia, com a camada de Bronzaline seria o mais perfeito dos croquetes...
Então, lá muito ao longe, começava a música para os meus ouvidos :
- Bola Nova ! Lá vou eu ! Uma senhora comeu uma dúzia !!!
Sr. Daniel, vermelho do sol e do esforço de empurrar o carrinho areal fora, ele vendia as melhores bolas de Berlim do mundo !
Noutras alturas era a senhora dos bolos a razão do meu fascínio. Seguia-lhe os gestos. A caixa branca, com a palavra Bolos escrita a encarnado, equilibrada numa rodilha à cabeça, era pousada na areia e, como quem abre um cofre, a tampa descia para que os tabuleiros pudessem sair e dessem lugar à minha excitação - Meu Deus, só há um mil-folhas, é para mim !
E mais os pirolitos, as gasosas, as oranginas.
E, anos mais tarde - é o Rajá fresquinho, é fruta ó chocolate !
Não me posso esquecer do senhor dos barquilhos carregando às costas a grande caixa cilíndrica vermelha, com a roleta em cima - Quantas voltas, menina ?
E eu a fazer rodar a roleta...e o ponteiro que nunca passava das 4 !
Depois os barquilhos passaram a línguas da sogra, vinham à dúzia em sacos de plástico, mas sem roleta nem tinham o mesmo sabor !
E, claro, as inesquecíveis, as incontornáveis, as indefectíveis batatas fritas.
Aquele gosto estaladiço a meio-sal, meio óleo, meio batata, meio sol, meio mar, ficou para sempre agarrado ao palato da memória.
Bom, bom mesmo, era comer as batatas a ver os Robertos ...
Às vezes, com a estridência das vozes nem se percebiam as falas, mas entendia-se o enredo, percebia-se a trama e era sempre o grande gáudio quando acabava tudo à marretada !
Vou comprar dessas batatas Gourmet, sentar-me no meu sofá a ver um Prós e Contras e sei que serei transportada aos meus tempos de menina... as batatas até que podem ser ligeiramente diferentes, mas há sempre uns fantoches para alegrar a malta !