Foi já depois do almoço que a pergunta saiu disparada pela Lili :
- E o teu livro ?
Durante aí uns 2-3 segundos os neurónios a debaterem-se entre eles: Sim o livro, ela ficou de trazer um livro ? Alguém lhe emprestou um livro? Ela tinha de devolver um livro ?
Quando os neurónios não se entendem uns com os outros como é que se há-de fazer luz no nosso espírito?
Perante a minha hesitação, o sorriso da Lili recua, semicerra-se-llhe os olhos e,de cenho franzido (sim, a palavra não é das mais bonitas mas, porra, toda a gente tem cenho e o cenho da Lili franze quando ela duvida!)diz:
- Sim, o teu livro para crianças...
- Ah...esse - digo eu como se, por acaso, tivesse escrito mais algum.
Os neurónios agitam-se, atropelam-se, vão de encontro às meninges enquanto a voz roufenha do altifalante vai chamando :
Atenção, atenção! Classe de neurónios de 78 é chamada com urgência à recepção ! Aos poucos lá vão aparecendo e soprando ao ouvido:
Já eras casada, tinhas as duas filhas, já há uns anos que tinhas deixado os estudos de mercado e entrado na publicidade. Mas a grande companhia era a mesma. Ainda com mais detergentes, mais margarinas, mais pastas de dentes, mais sabonetes....
(Sabem, a grande companhia ainda lá está, mas maior, por isso vende mais detergentes, mais margarinas, mais pastas de dentes, mais sabonetes...)
- Olga, arranja-me um ! Leio sempre para os meus netos ! Gostava de lhes ler o teu !
- Aquilo é só um livrinho...feito à pressa ! - não é desculpa de falsa modéstia, é a verdade!
E conto:
Um dia a... (bloqueio total - só devo ter um neurónio acordado e esse manda-me imagens sem som - um rosto miúdo,os olhos fecham quando ri, morena, girinha -acorda outro que me lança frases em estilo sms.):
Oh, pá, vocês sabem, teve um filho chamado Nicola, de um italiano...
Salva-me a Lena Coito: - A Maria João Macedo !
-Essa mesma ! - como é que me fui esquecer de um nome que dei à minha própria filha !
...então um dia a MªJoão veio ter comigo, ela falava por repentes.De jacto.Com risos pelo meio.Tudo sempre a fervilhar naquela cabeça.Vamos fazer livros infantis com algum fundo didáctico.
Também veio ter com boa. Em menos de um instante formámos um Grupo Editorial : Grupo Puero, criança em grego ou latim,não interessa. Qual Leya qual coisa.
Grupo Puero !
Eu e ela ! Tudo com muita pressa, para aproveitar uma aberta numa tipografia de um amigo dela.
Trouxe-lhe a história logo no dia a seguir. Reis, rainhas, princesa, reino sem flores, tudo para explicar a função da clorofila.
Tivemos de alargar o grupo para três, por causa das ilustrações.
Essas também têm que se lhe diga. Dei a história a ler ao meu parceiro criativo, o Carlos Marques e ateei-lhe a pressa.
No outro dia traz-me maquetas para ver se eu gostava e fazer as alterações que fossem precisas e passar à fase final.
Mostrei à MªJoão. Estão óptimas ! E foram mesmo assim !
Revisão de provas ? Nenhum dos meus neurónios se lembra.
Mas se houve porque é que majestade vem com um g ?
Resumindo, fizeram-se 5.000 exemplares que a Agência Portuguesa de Revistas espalhou por todo o país.
Sobraram para aí uns 600. Feitas as contas deu para pagar à tipografia.
Pegámos em 500, muito bem embalados, mandámos para as crianças de Cabo Verde.
Ali, depois do Saramago e do Lobo Antunes sou a escritora portuguesa, viva, mais lida.... (esta informação foi-me dada por um neurónio já com os copos)
E pronto ! Esta é uma história simples de um livro cá do meu bairro...
- Olga, arranja lá um, eu pago, eu pago - insistia a Lili, já com várias a fazer coro,enquanto me abria a carteira a um palmo do nariz?
- Ok, amiguinhas eu vou mandar o livro.
E como a vida custa a todos vão mesmo pagá-lo.
Já fiz o câmbio para euros
Quando a gente se tornar a ver dão-me 10 cêntimos cada uma !
(eheheheh)
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